Lembro-me de ir ver 'A queda do egoísta Johann Fatzer' num teatro bolorento do parque mayer. Terá sido em 98 e eu estava ainda muito verde nisto do teatro, e no resto também, completamente fascinada a olhar para aquele palco cheio de actores que falavam como ninguém falava, fazendo pausas a meio das frases, e que se moviam como num bailado, espalhados por todo o lado. Penso que não terei percebido muito bem a peça. Mas adorei. Comprei o programa, que ainda guardo. E acho que foi por aquela altura que me tornei espectadora de teatro. Acompanho os Artistas Unidos desde então. Na Capital e nos outros sítios por onde andaram. E fomos envelhecendo juntos. Com a Sarah Kane e o Pinter. Os nórdicos de que nunca tínhamos ouvido falar. Os escoceses, os irlandeses, os espanhóis, os italianos. Cada qual com uma pronúncia inglesa mais difícil de perceber do que o anterior. Dores de cabeça para desgravar as entrevistas. O Jorge, a beber chá e a fumar cigarros, enquanto nos conta histórias dos filmes que viu na juventude. O Miguel Borges a trepar pelas paredes, agarrado aos canos, a cair no chão. O Paulo Claro que perdemos, uma notícia difícil de dar. Uns espectáculos melhores e outros piores. E eu e a Clara sentadas em cadeiras de veludo vermelho num prédio a cair de podre, a vermos tudo. O bairro alto. As noites e os copos. Os dramas e as recuperações. Minhas e deles. Os namoros e os filhos que foram nascendo. Meus e deles. Os actores que partem para outras aventuras, os novos actores que ali aparecem, e os de sempre. Conheço-os pelos nomes mesmo que eles não saibam quem eu sou. Vou-lhes descobrindo rugas novas a cada espetáculo. Cabelos brancos. Sentimentos que até aí ainda não tinham sido explorados. De vez quando, persistem, as frases cortadas nos sítios estranhos. Uma sensação de familiaridade.
A partir de quinta-feira, os Artistas Unidos apresentam 'A morte de Danton', no Teatro Nacional D. Maria II, em Lisboa. Vão ver, vão lá ver. É só um texto e muitos actores. E é tão bom outra vez.
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