Wednesday, August 15, 2007

"Vamos fazer um pecado rasgado, suado, a todo vapor". Até já.




"Deixa a tristeza pra lá, vem comer, me jantar
Sarapatel, caruru, tucupi, tacacá
Vê se me usa, me abusa, lambuza
Que a tua cafuza
Não pode esperar"

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Tuesday, August 07, 2007

Simplex

O nome e a morada e a data de nascimento, o número do bilhete de identidade e o de contribuinte, o número da conta, o número do telefone. Uma vez e outra e outra e outra e ainda mais outra. Cinco vezes. Em cinco folhas diferentes. O nome do pai e da mãe, que havemos de ter cinquenta anos e ainda não somos ninguém por direito próprio, temos que dar o nome do pai e da mãe e dizer onde nascemos e com que nacionalidade. Mas… não sabiam já? Mas… não dei já uma fotocópia? É que já me dói o pulso e não acho normal. Tenho conta neste banco desde que nasci, é aqui que recebo o ordenado e pago a água e a luz. Conhecem a minha miséria por dentro mas não sabem o meu nome? Pois sim, mas tem que escrever de novo, em letra de forma, não se esqueça, e assinar e rubricar. E isto foi só para pedir um crédito à habitação. Diz que para vender a outra casa é preciso pedir a certidão de nascimento e a de casamento. O quê? Desculpe, mas parece que na certidão de casamento diz lá onde nascemos, não é? Isso não serve? E o bilhete de identidade também diz onde nasci, também não serve porquê? Não, não, não, isso seria demasiado fácil. É preciso ir a uma loja do cidadão, tirar uma senha, esperar na fila, pagar uns euros e escrever outra vez o nome e a morada e a data de nascimento. Estão a gozar comigo? O senhor do banco olha para mim com cara de poucos amigos, pois, minha senhora, a culpa não é minha, é mesmo assim, são os procedimentos, estende o dedo na direcção do papel, e agora tem que escrever aí e em maiusculas, está a ver?, nesses quadradinhos, escreva bu-ro-cra-cia.

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Thursday, August 02, 2007

A casinha e o chapeuzinho e as cartas

A casinha, sim, mas agora também o chapéuzinho vermelho (versão brasileira, claro) e as cartas rasgadas (da Adriana Calcanhotto, também brasileira). Pela estrada fora eu vou bem sozinha levar estes doces para a vovózinha. Rasgue as minhas cartas e não me procure mais, assim será melhor. Isto tudo depois de já ter contado uma história, vitória, vitória, e de ter dado muitos beijinhos. O ritual para adormecer cresceu tanto quanto ele, que agora já não usa chucha e diz boa noite antes de dormir. Ainda é uma beleza mas dá um bocado mais de trabalho.

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A casinha - ha um ano era assim

Mãe, canta a casinha, mãe. Na penumbra do quarto, a voz sai quase sussurrada.

Eu tenho uma casinha lá na Marambaia, fica na beira da praia, só vendo que beleza, tem uma trepadeira que na Primavera fica toda florescida de brincos de princesa.

Moreno Veloso canta muito melhor do que eu e, na versão original, a música é mais rápida, mais acelerada. Não foi pensada para canção de embalar, suponho. Mas quando se tem um bebé de meses em pranto no colo uma pessoa tenta qualquer coisa. Tom Jobim, João Gilberto, Adriana Calcanhotto, Caetano Veloso, Gilberto Gil. Vai minha tristeza e diz a ela que sem ela não pode ser. Entre por essa porta agora. Felicidade foi embora e a saudade no meu peito. Cada um tem o seu repertório e eu, à falta de músicas com galinhas doidas e coelhinhos de olhos vermelhos (haveria de as aprender, mas mais tarde), cantava as que sabia. Uma aproximação. O pato vinha cantando alegremente. Gosto muito de você leãozinho. Traga-me um copo de água, tenho sede. Até que encontrámos “a casinha”.

Quando chega o Verão eu me sento na varanda, pego o violão e começo a tocar. Minha morena que está sempre bem disposta senta-se ao meu lado também a cantar.

O choro parou.

Quando chega a tarde um bando de andorinhas passa em revoada fazendo o Verão e lá na mata o sabiá gorjeia uma linda melodia pra alegrar meu coração.

Desde então, o ritual repete-se todas as noites. Mãe, canta a casinha, mãe. E eu canto. Trocando as voltas à melodia, desafinando a torto e a direito, acariciando-lhe de mansinho a testa quente. Enrodilhado nos lençóis, o puto acompanha a letra, sabe-a de cor mesmo que não faça ideia o que é uma princesa, uma morena ou um sabiá.

Às seis horas da tarde o sino da capela bate as badaladas da avé Maria e a lua nasce por detrás da serra anunciando que acabou o dia.

Nesta altura, com a voz já meio embargada, ele diz ó-ó, volta a pôr a chucha na boca e aconchega-se no seu cantinho para dormir a noite inteira. E isso é que é uma verdadeira beleza.

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